Capitán Gosende
- Anjo Torres (colectivo Capitán Gosende)
- 21 oct 2016
- 3 Min. de lectura
Foi lá a começos do ano 2012 quando um grupo de pessoas decidimos botar a andar um novo coletivo cultural e ecologista que recebeu o nome de Capitão Gosende. Foi em Pedre, e o nome escolhido quis lembrar a figura histórica de Alonso de Gosende, quem a finais do século XVI chefiara a milícia de Terra de Montes que participou na defesa da Corunha perante o ataque da Armada inglesa (um desses ataques que o povo galego teve que aturar, sem comê-lo nem bebê-lo, por fazermos parte da monarquia hispânica).
Um antecedente combativo que nos pareceu acaído para um coletivo que queria dar algo de guerra num território que leva demasiados anos sumido na paz dos cemitérios, o território que durante mais de um século e até há dous dias se conhecia pelo nome de “Ayuntamiento de Cerdedo” ou também “Concello de Cerdedo”. Uma terra à que nos unem laços de vizinhança, familiares ou de interesse e gosto pessoal. E uma terra que necessitava que, como mínimo, alguém lhe metesse o dedo no olho ao ruim caciquismo dominante tantas vezes como for possível.
Assim começou a caminhar um projeto que se afastou do associacionismo ao uso, fugindo dos formalismos habituais e parecendo-se mais a uma espécie de “grupo de afinidade” que, porém, esteve (e está) aberto à participação de quem tiver interesse. É assim como nestes quatro anos fomos somando, felizmente, novas e novos amigos.
A consigna era clara: passá-lo bem, conhecer e desvelar os secretos deste cachinho do País e assinalar a quem estava a perpetrar a sua morte programada. A partir de aí iniciou-se a nossa jeira de caminhadas pelas pistas, congostras e rios das freguesias de Cerdedo, Pedre, Figueiroa, Quireza, Folgoso, Tomonde, Parada e Castro (e alguma outra de Terra de Montes e mesmo de fora da comarca).
Muitas sidras, cafés, cervejas e vinhos depois o balanço, humildemente, não está mal de tudo. Podemos mencionar a património histórico achado e dado a conhecer através da imprensa e de visitas guiadas (tentando paliar a ineptitude, ignorância e falta de vontade do governo municipal), a exitosa convocatória anual do “Roteiro da Pantalha” na noite do 31 de outubro (em parceria com a associação pontevedresa Amig@s da Cultura até a edição deste ano), a nossa aportação para a recuperação da memória do Cerdedo rebelde e popular, a teima na defesa do território e na denúncia dos projetos de infraestruturas e indústrias desnecessárias e agressivas como o AVE ou o parque eólico do Campo das Antas ou a recente coorganização da “XXIX Romagem de Crentes Galegas” da associação Irimia que reuniou no Monte do Seixo mais de um milhar de pessoas vindas de toda a Galiza e que contou também com a colaboração da associação Canón de Pau de Cotobade.
Até aqui uma pequena apresentação de Capitão Gosende. E agora que Cerdedo não existe mais?

Liquidado o concelho de Cerdedo e integradas as suas freguesias num novo ente artificial que o caciquismo inventou como um remendo de curto percorrido com o que tentar fazer ver que fazem algo para evitar o que eles mesmos provocaram (quanto demorará “Cerdedo-Cotobade”, sem medidas mais profundas que esta fusão, em voltar a ficar por baixo de 5000 habitantes?), quiçá seja o tempo de voltar a reivindicar com força a milenar Terra de Montes em toda a sua amplitude e com todas as suas paróquias. Percorrê-la saltando as linhas arbitrárias de concelhos e províncias, contribuir para estreitar laços de novo e manter viva a identidade do berce do Padre Sarmento, de Manuela de Barro, de Avelino Cachafeiro, de Chano Pinheiro e de tantos e tantas labregas, canteiros, artistas, agraristas, sindicalistas e intelectuais que pularam pelo bem do País e a justiça social. E é que nós, igual que nos amparamos na lembrança do Capitão Gosende, também o fazemos na dos labregos que expulsaram o invasor francês (o exército mais poderoso do mundo daquela); na das irmandinhas derrubando a fortaleza do Castro de Montes, o símbolo do domínio feudal e clerical; na da união entre agraristas e sindicalistas que estava a fazer possível o impossível e por isso foi brutalmente ceifada pelos que só são democratas quando vão ganhando…
Desde logo resta muito por fazer e, ainda que as dificuldades sejam muitas numa terra avelhentada e em devalo demográfico continuado, cumpre que quem tenha azos faga o possível porque a Terra de Montes tenha uma nova vida. Pela nossa parte, enquanto houver força e vontade, seguiremos a percorrer os caminhos para, como diria um companheiro, fazermos valer o fermoso sobre o bonito, que já é bastante…
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